"Lucas Puntel Carrasco
A manchete chama atenção! Livros doados ao Gabinete de Leitura estão espalhados pelo chão, fora das prateleiras, parece que jogados. As fotos que registram o flagrante circulam pela internet, o caso saiu no jornal e está indignando muita gente.
Por outro lado, a coordenadora do Gabinete, Cristina Babone, explica que “muitos livros vêm rasgados, faltando capa, com baratas, urina de rato”, então o processo de triagem e limpeza “é feito no chão, onde é mais fácil realizar o trabalho”. Para o secretário municipal de Cultura, Ney Fina, não se sabe qual é o interesse de quem tirou aquelas fotos, mas segundo ele “não é a realidade do Gabinete de Leitura”.
Realidade ou exagero, eu já não acho muito absurdo ver livros no chão. Aqui em casa, por exemplo os livros têm também outras funções além de esquentar lugar na prateleira. São quase móveis da casa: uma pilha apoia a lamparina, outra ajeita o telefone, acomoda o porta-retratos, segura a máquina de escrever. Os livros parece que se movem sozinhos, é meio sobrenatural. E já não cabe nenhum outro exemplar. Mais um pouco, e eu fundaria uma biblioteca!
Enquanto vivi em Rio Claro, na infância, sempre frequentei as bibliotecas do Gabinete de Leitura, do Centro Cultural e do Círculo Operário. Lia Isaac Asimov, Pedro Bandeira, a Série Vaga-Lume... Ah, como era gostoso visitá-las! Abrir aquelas gavetinhas de alumínio, sentir os dedos correndo nas fichas de registro, caminhar aleatório pelos corredores até encontrar algum livro bacana. Eu me guiava pelo inesperado.
E, inesperadamente, vocês sabiam que, num distrito de S. José dos Campos, trancafiaram os livros na antiga cadeia pública? Um sujeito de lá chamado Sidnei Rosa foi assuntar na subprefeitura, que mandou dizer que a chave da cela estaria na escola, mas ali diziam que a chave ficava era na subprefeitura mesmo. Rosa nem se meteu no fogo cruzado, montou sua própria biblioteca. Doações de livro foram chegando, depois tijolos e cimento. E eis a Biblioteca Solidária, com 13 mil livros livres para o leitor.
E de biblioteca em açougue, já ouviram falar? Foi assim, aos 16 anos Luis Amorim aprendeu a ler. Ex-engraxate de Brasília, foi trabalhar em um açougue e, ali mesmo junto às carnes, pendurou 10 livros numa prateleira. Pois é... hoje, além de vender contra-filé, também ainda leva a leitura 24h aos pontos de ônibus da capital. São mil empréstimos diários!
Livros em açougue, saindo do lixo ou trancafiados na cadeia. Por esse Brasil afora, tem acervos surgindo de lugares inusitados. Pelo visto, para eles o que vale é a boa vontade. Assim como para o grupo de pessoas em Rio Claro que, pela internet, organizou um mutirão para colaborar na triagem dos livros do Gabinete de Leitura. Parece que mais de 30 pessoas já confirmaram a participação para o próximo sábado, das 9 ao meio-dia.
(O autor é escritor e editor - lucaspuntelcarrasco@gmail.com)"
Publicado originalmente http://jornalcidade.uol.com.br/rioclaro/Colaboradores/colaboradores/79217-Livros-jogados-no-chao--
sexta-feira, 22 de julho de 2011
Livros “jogados” no chão
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