segunda-feira, 7 de junho de 2010

42% das escolas em Mato Grosso não têm biblioteca

Por Fernando Duarte

Com a aprovação da Lei 1.244 que obriga a instalação de bibliotecas nas escolas, Mato Grosso terá que reforçar o investimento nesse espaço de aprendizado básico. Das 704 escolas da rede estadual, mais de 300 não possuem biblioteca. Em Cuiabá, das 97 escolas municipais, quase 30 não contam com a estrutura, e as que possuem não estão no padrão de qualidade exigido pelo Ministério da Educação (MEC).

Muitas vezes não existem livros catalogados ou locais adequados para colocar os títulos e a figura do bibliotecário é exercida por professores, ou seja, desvio de função. O governo federal deu um prazo de 10 anos para todas as escolas se adequarem à lei.

A Escola Municipal Irmã Maria Betty Pires, no bairro Novo Mato Grosso, em Cuiabá, existe há 20 anos e não possui biblioteca, somente um espaço usado como "depósito" de livros. Esse cubículo, de 3 por 3 metros, conta apenas com uma lâmpada e um ventilador. Os livros ficam amontoados, próximos a uma caixa de papelão e dificilmente cabe mais de 3 alunos lá dentro. O local era uma antiga sala de apoio, onde os estudantes recebiam reforço das aulas.
Na Escola Municipal Doutor Fábio, em Cuiabá, a biblioteca dos estudantes é um carrinho de supermercado, que vai de sala em sala.

Os livros entregues pelo MEC ainda estão nas caixas porque não há local adequado para colocá-los. "Os professores só trabalham com esses livros na sala de aula", explicou a coordenadora da escola, Maria Aparecida de Almeida.

Ela lembra que existe procura pelos estudantes por livros, mas a falta de estrutura coloca apenas os títulos didáticos à disposição. Almeida destaca que o principal motivo é a falta de recursos, por isso a intenção é que uma empresa privada ou estatal faça uma parceria com a unidade para que invista na infraestrutura educacional.

"Nem sabia que tinha esse espaço", disse Paulo Vinícius Arruda, 12, que está no quinto ano. A outra estudante, Angélica Patrícia Gomes da Silva, 10, diz que gosta de ler e procura os professores, mas, apesar do interesse, tem como barreira a falta de um lugar específico. "Se tivesse mais livros seria bem melhor".

A escola Irmã Maria também necessita de mais segurança. No final do ano passado, a Secretaria Municipal de Educação (SME) repassou 12 computadores para a instituição, no entanto, poucos dias depois todos foram roubados. Como não houve uma reposição, o local que deveria ser uma sala de informática tem hoje mesas vazias e um emaranhado de fios.

Carrinho de compra - Na Escola Municipal Doutor Fábio Firmino Leite, no bairro Dr. Fábio, também não há biblioteca. Ela já teve um lugar específico para os livros, mas o local teve que dar espaço para uma sala de informática. Os livros, então, foram remanejados para uma sala que atualmente é de apoio.

Segundo a diretora Dalva Catarina do Nascimento, os estudantes leem nas salas de aula ou nos corredores. Para isso, uma rede de supermercados da Capital doou um carrinho de compras em que são postos os livros e entregues de sala em sala, numa espécie de "biblioteca ambulante". "Nós precisamos de 2 carrinhos, mas o supermercado que nos apoiou só deu 1".

Tanto os livros acumulados na sala de apoio quanto os do carrinho não são catalogados e não têm divisão por assunto ou por autor. Assim, os alunos procuram aleatoriamente os títulos. "Por causa da demanda do bairro foi necessário transformar a antiga biblioteca em sala de aula".

A diretora afirma que o terreno da instituição é amplo, onde poderia ser construída uma biblioteca, porém ela aponta a falta de recurso para que um possível projeto seja implementado.

Sala de apoio - A Escola Estadual João Crisóstomo de Figueiredo está localizada 3 quadras depois da Firmino Leite. Ao entrar na biblioteca da instituição, a impressão que se tem é que uma nova sala de aula foi construída no local. O ambiente também virou sala de apoio, por isso, o silêncio característico e necessário para uma biblioteca não existe.

Assim, não apenas os professores sofrem com os "desvios de função", mas a própria estrutura das escolas que, por falta de espaço, é obrigada a receber estudantes que precisam de reforço escolar.

A coordenadora da escola, Rosilene Amorim, lembra que, como não existe um bibliotecário, o espaço é administrado pelos professores e, às vezes, até por ela mesma. "Na medida do possível, quando os estudantes demoram para encontrar um livro, eu ajudo a procurar".

Na biblioteca da João Crisóstomo também não existe uma organização dos livros por título ou autor e nem armários suficientes para colocá-los (muitos deles estão no chão).

Exemplo - A Escola Estadual Djalma Ferreira de Souza, no bairro Morada do Ouro, é um exemplo de acesso a livros (didáticos ou não) aos alunos. Na escola existe uma biblioteca em que os livros estão catalogados no computador, com a quantidade total e os títulos em ordem alfabética.

Na seção "A" estão mais de 400 livros de pesquisa e sobre informações do Estado; na "B" estão os relacionados a poemas, teatro, cultura em geral, com mais de 700 unidades; na "C" estão 560 livros relacionados a contos, novelas, etc; e na "D" estão os quadrinhos de autores como Ziraldo.

"Achei que dessa forma ficaria melhor", conta a professora (que atua como bibliotecária) Maria da Glória Carvalho. "Ensinar é viajar nos livros".

A escola tem 540 alunos, ou seja, tem mais de 3 livros por aluno, 2 livros a mais que o solicitado na lei do governo federal que exige pelo menos um título para cada estudante matriculado.

Os livros podem ser emprestados por uma semana ou mais. Quando o aluno pega um deles, se identifica em uma ficha que fica na biblioteca, assim Carvalho tem o controle de saída e entrada.

A aluna Letícia Antunes, 11, além dos didáticos, lê também romance. O último que concluiu foi "Lua Nova". "Tenho que pegar Crepúsculo ainda".

Para livros que o MEC não disponibiliza, os alunos têm acesso por meio de doações de professores ou arrecadando dinheiro entre eles. "Leio só um por mês, mas são todos livros grossos, com muitas páginas".

Outro lado - A coordenadora de Biblioteca Escolar da Secretaria de Estado de Educação (Seduc), Telma Peres, apontou que entre os anos de 2007 e 2010 houve um grande aumento do número de bibliotecas no Estado: de 99 para 400. Segundo ela, isso se deve a injeção de recursos federais pelo Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) e Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Peres afirma que 100% das escolas não possuem biblioteca por falta de "espaço físico" e acaba não tendo possibilidade de construir os locais adequados. Em relação ao "desvio de função", ela lembra que não há profissionais graduados para ocupar o cargo de bibliotecário. "Só a Universidade Federal de Mato Grosso de Rondonópolis (212 km ao sul de Cuiabá) tem o curso de Biblioteconomia".

A coordenadora de Organização Curricular da Secretaria Municipal de Educação, Eliane Quinhone, reconhece que das 70 bibliotecas nas escolas municipais, poucas têm um espaço adequado e um acervo para todos níveis escolares, com o parâmetro utilizado pelo MEC.

Mas destaca que Cuiabá possui bibliotecas modelo, como a da Escola Ranufo Paes de Barros, em que a estrutura também é aberta para a comunidade, e que fazem parte do projeto "Saber com Sabor".

Quinhone afirmou que desde 2008 o município faz adequações, inseridas no Plano de Ação Articulada (PAR), em que estão programadas a construção e adequação de 10 bibliotecas por ano em Cuiabá.

Fonte: Jornal A Gazeta
http://www.reporternews.com.br/noticia.php?cod=284388

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