sexta-feira, 23 de julho de 2010

Centros para recuperar a memória corporativa criam oportunidades

Por Jacilio Saraiva

"Mercado de trabalho: Empresas investem na valorização de seu patrimônio cultural e contratam profissionais especializados em museologia, história, arquivologia e biblioteconomia.

Cada vez mais empresas têm se preocupado em criar centros de memória para guardar documentos, objetos, fotos e imagens que contam a história da organização. Assim, um novo mercado de trabalho começa a ganhar força, principalmente para profissionais das áreas de museologia, história, arquivologia e biblioteconomia. Os núcleos têm equipes enxutas e, no Brasil, pelo menos 15 corporações como Bunge, Unilever e Bosch mantém investimentos com essa finalidade.
Para Dalva Marques, diretora da Asap, consultoria que recruta executivos de média gerência, os profissionais que trabalham em centros de memória empresariais começam a ganhar maior visibilidade no mercado. "Mais organizações estão enxergando as iniciativas de valorização da história empresarial como parte de uma estratégia para mostrar valores culturais, sociais e históricos", analisa. "Os colaboradores se identificam e os acervos podem fazer parte de uma política de retenção de talentos. Ao mesmo tempo, é possível atrair pessoas alinhadas com essa cultura organizacional."
Os profissionais precisam ser capazes de atuar na gestão de informações e de ações internas como orientação a pesquisas, organização de visitas, exposições, palestras e até iniciativas de integração de novos funcionários. Segundo Lygia Rodrigues, diretora da Grifo Projetos Históricos, que desenvolve projetos para a Unilever e para o Metrô de São Paulo, as empresas que desenvolvem centros de informação histórica são, geralmente, de grande porte, têm mais de 30 anos de atividade e estão em um estágio avançado na área de responsabilidade social corporativa. Até o fim do ano, a Grifo espera fechar até três novos contratos de formação e manutenção de centros corporativos.
O Centro de Memória Bunge, de uma das principais empresas de agronegócio e alimentos do país, reúne mais de 600 mil imagens, 1,3 mil caixas de documentos, 3 mil peças de filmes e 100 horas de depoimentos de funcionários. "O acervo conta a trajetória da indústria e do agronegócio brasileiros, com informações sobre arquitetura, design, marketing e propaganda, a partir da história da Bunge", explica Cláudia Calais, gerente de responsabilidade social da Fundação Bunge, que coordena a unidade. O investimento anual para a manutenção do centro é de cerca de R$ 700 mil.
Para dar conta do recado, Cláudia montou uma equipe de três profissionais: uma museóloga, que coordena o núcleo; uma documentalista, com especialização em historiografia e arquivologia; e uma analista de assuntos institucionais, com formação em comunicação social, planejamento e marketing. Além da gerência do material, o grupo organiza exposições, visitas e palestras. No ano passado, foram 11 visitas e 494 pedidos de pesquisas atendidos. Este ano, a Bunge organizou um encontro que reuniu 15 centros de memória de grandes grupos para discutir como
os equipamentos podem ser usados como ferramenta de gestão empresarial.
Estão previstos outros dois eventos em 2010.

Na Unilever, uma equipe de sete pessoas - a maioria historiadores com formação em arquivologia - trabalha no Centro de História Unilever, criado em 2001 com a ajuda de uma empresa especializada em projetos históricos. "Os funcionários realizam um trabalho permanente de pesquisa e levantamento de documentos para garantir o registro das principais iniciativas da empresa e de suas marcas", explica Agatha Faria, gerente de comunicação externa. Toda a documentação recebe um tratamento que vai desde a descrição em um banco de dados eletrônico até o acondicionamento de acordo com a origem dos itens.
São mais de 65 mil documentos entre anúncios impressos, comerciais de TV, peças promocionais, embalagens, fotografias, jingles, vídeos institucionais e depoimentos de profissionais.
Desde o ano passado, o centro da Unilever mantém um sistema integrado ao Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC) da companhia, que direciona contatos feitos em busca de informações históricas. Em 2009, foram feitas mil consultas. "Os centros de memória têm um papel importante, pois contribuem para que as instituições preservem e compartilhem um legado de conhecimento com a sociedade."
Para Sandra Reis, coordenadora do Centro de Memória Bosch, do grupo Bosch, em Campinas (SP), o objetivo da empresa com a formação da unidade, em 2003, era resgatar e organizar seu patrimônio cultural. O centro faz parte do Instituto Robert Bosch, braço social da companhia no país. Emprega uma cientista social com especialização em arquivos e uma estagiária de história. "O trabalho foi pioneiro entre as regionais da Bosch fora da Alemanha", afirma.
O núcleo tem 2,5 mil peças de audiovisual, 50 mil imagens no acervo iconográfico, 1,5 mil plantas e cartazes e 52 depoimentos de colaboradores e ex-empregados.
A Bosch, que atua nos setores de tecnologia automotiva, industrial, de construção e bens de consumo, planeja ainda usar a unidade em atividades de integração de novos funcionários, treinamentos e encontros com fornecedores.
A Natura, Eletrobrás e a Algar Telecom (ex-CTBC) também já têm centros de memória próprios. Outras empresas estudam a criação de complexos do gênero. "Estamos avaliando o melhor formato e espaço", revela Maria Helena Monteiro, vice-presidente de relacionamento e administração da SulAmérica. A partir de 2007, a companhia começou a organizar seu acervo com a ajuda de uma bibliotecária. O conjunto reúne cerca de 100 pastas de fotos e documentos, que contém desde a primeira apólice emitida pela seguradora até relatórios anuais. A SulAmérica tem 114 anos de mercado.
É preciso ser comunicativo e ter experiência com arquivos Os profissionais que desejam concorrer a vagas em centros de memória corporativos precisam ter experiência no setor de arquivos e facilidade de comunicação para oferecer suporte às pesquisas e interagir com outras áreas da organização. Conhecer a empresa profundamente e o ramo de negócio onde ela se insere também pode ajudar os funcionários a se manterem no cargo.
Para Dalva Marques, diretora da Asap, especializada no recrutamento de executivos e consultoria de RH, é comum nessa área a existência de equipes multidisciplinares. Na opinião de Cláudia Calais, gerente de responsabilidade social da Fundação Bunge, noções de história e comunicação são fundamentais.
A gerente de comunicação externa da Unilever, Agatha Faria, ressalta que os funcionários dos centros precisam ser, antes de tudo, bons pesquisadores. "Além de reunir as informações, eles devem ser capazes de compreender o contexto de desenvolvimento da empresa e do mercado onde ela atua", afirma. De acordo com a historiadora Lygia Rodrigues, que presta serviços para centros de memória, há poucos cursos de graduação em arquivologia no Brasil. Exsitem opções no Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e em Brasília.
Agatha afirma que o executivo deve ser comunicativo, pois o trabalho exige o relacionamento com diferentes áreas da empresa e o atendimento a consultas. "O coordenador do centro precisa ter experiência no gerenciamento de equipes e criatividade para captar as melhores formas de divulgar o material colhido. Saber atuar em sintonia com as estratégias de comunicação institucional também é importante." Para Sandra Reis, coordenadora do Centro de Memória Bosch, é necessário montar exposições temáticas e dar suporte à produção de materiais de comunicação da empresa.
"Um bibliotecário pode direcionar a maneira correta de catalogar e arquivar documentos para facilitar o acesso no futuro", diz Helena Monteiro, vice-presidente de relacionamento e administração da SulAmérica, que já começou a organizar a "memorabilia" da corporação. "A profissional responsável trabalhava na companhia e conhecia o segmento de seguros, o que ajudou na compilação dos materiais." (JS)

Publicado originalmente no Jornal Valor Economico de 23/07/2010
Material enviado por Wellington Ferreira Rodrigues

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